quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Mãe que me deste a poesia por eternidade
embora me doa imenso criá-la,
a mágica beleza das palavras quando as posso merecer,
é só por elas que eu hoje vivo cantando.

Não posso fazer
grandes louvores à vida
mesmo sabendo que me é tão precioso viver,
digo-o aqui para que se entenda que o meu chão, a minha terra, traz-me sonhos terríveis e muito sangue a escorrer e demasiada ambição e se escrevo com uma certa brandura é porque pronuncio as palavras já com medo de as matar e eu queri-as vivendo e iluminadas de fascínio. Voar é não deixar morrer a música, a beleza, o mundo e é também fazer por escrever tudo isso. Nada pode ser mais deslumbrante que esta relação com a vida e por essa razão me obstinam as aves e me esforço por querer sê-las. Eu gosto do modo como desarrumam os meus assombros, os meus desesperos ante tanta podridão e também como me alarmam quando quererm não admitir certas coisas. Estou contente mãe, deste-me a poesia por eternidade embora me doa tanto criá-la, aqui, na pátria da lassidão.

(Eduardo White, em "Poemas da Ciência de Voar e da Engenharia de ser Ave")
Não faz mal.

Voar é uma dádiva da poesia.
Um verso arde na brancura aérea do papel,
toma balanço,
não resiste.

Solta-se-lhe
o animal alado.
Voa sobre as casas,
sobre as ruas,
sore os homens que passam,
procura um pássaro
para acasalar.

Sílaba a sílaba
o verso voa.

E se procurarmos? Que não se desespere, pois nunca o iremos encontrar. Algum sentimento o terá deixado pousar, partido com ele. Estará o verso connosco? Provavelmente apenas a parte que nos coube. Aquietemo-nos. Amainemos esse desejo de o prendermos.

Não é justo um pássaro
onde ele não pode voar.

(Eduardo White, em "Poemas da Ciência de Voar e da Engenharia de Ser Ave")